“A medicina de emergência é uma especialidade pujante, conectada com o futuro e em franco crescimento”, destacou a presidente da Associação Brasileira de Medicina de Emergência (ABRAMEDE), Camila Lunardi. Nesta semana, a especialista acompanhou a realização do IX Congresso Brasileiro de Medicina de Emergência (CBMED), em Campo Grande, onde defendeu a excelência na formação de novos especialistas.
Em entrevista com a equipe do evento, ela comentou alguns dos principais desafios impostos e rotas traçadas para fazer avançar o plano de ampliação do número de médicos emergencistas no Brasil. No bate-papo, a presidente detalhou os progressos desde o reconhecimento da especialidade médica e também destacou a importância do engajamento de jovens médicos e da certificação dos profissionais. Confira abaixo, a íntegra da entrevista:
Ainda existem entraves para o reconhecimento e a valorização da medicina de emergência no Brasil? Quais são eles?
Camila Lunardi — Por meio da intensa atuação da ABRAMEDE, a medicina de emergência conquistou avanços significativos nos últimos anos. O reconhecimento como especialidade médica em 2015 foi um marco, seguido pela oficialização da ABRAMEDE como representante junto à Associação Médica Brasileira (AMB) em 2017. Desde então, temos consolidado perante o poder público e as demais entidades médicas, o papel da especialidade, bem como o diferencial proporcionado pela inclusão de um emergencista dentro dos departamentos de pronto atendimento. Hoje, inclusive, fazemos parte do Conselho Deliberativo da AMB. A ABRAMEDE foi eleita como membro efetivo, por meio de uma votação realizada entre as próprias sociedades de especialidades médicas.
Se há reconhecimento oficial dentro do campo médico, quais são os desafios atuais?
Camila Lunardi — Um ponto fundamental, que transpassa a questão do reconhecimento da especialidade, é a ampliação do número de médicos emergencistas. Nossa meta para os próximos anos é a expansão. Nesse sentido, há dois caminhos a percorrer. O primeiro é despertar o interesse dos jovens médicos a ingressar nos serviços de residência da especialidade. Fazê-los perceber que a medicina de emergência é uma especialidade pujante, conectada com o futuro e em franco crescimento. Outro passo significativo é ampliar a conscientização dos médicos que já têm um histórico na área a buscar o Título de Especialista de Medicina de Emergência (TEME), por meio da prova promovida pela ABRAMEDE. Há milhares de médicos que trabalham em prontos-socorros e dedicam a vida a um departamento de emergência sem titulação.
Quais mudanças podem ocorrer a partir dessa consolidação?
Camila Lunardi — A partir dessa expansão do número de médicos emergências no Brasil como um todo, será possível requerer junto às autarquias responsáveis algumas medidas de valorização. Uma delas é que exista ao menos um emergencista como responsável técnico em todos os departamentos de emergência. Além disso, que os gestores dos departamentos de emergência coloquem os emergencistas como prioridade no escopo de contratações. Ou ainda, que as residências de medicina de emergência só sejam abertas se o médico responsável for um emergencista e que os serviços pré-hospitalares também priorizem os emergencistas. São grandes desafios, mas possibilidades palpáveis.
Por que o estudante que está se formando em medicina deve escolher a residência de medicina de emergência, ao invés de outra especialidade?
Camila Lunardi — Existe uma variável de suma importância, que é o perfil do médico. É preciso aferir se ele tem interesse no atendimento de paciente crítico e tem sensibilidade para lidar com a diversidade na assistência. Atender quadros clínicos, cirúrgicos, lidar com problemas ortopédicos, com adolescentes e crianças, enfim, toda uma gama de pacientes e situações. O médico emergencista é aquele que enxerga qualquer pessoa como um potencial paciente e está sempre pronto. Na maioria das vezes, são atendimentos rápidos, mas que por isso mesmo exigem preparo técnico e precisão. Aqueles que têm esse perfil devem buscar uma residência em medicina de emergência para buscar qualificação e atuar com excelência. Atualmente, muitos médicos se formam e vão para a sala de emergência trabalhar. No entanto, o que a ABRAMEDE vem fazendo é demonstrar que a emergência não é o lugar daqueles que somente precisam cobrir um plantão. A medicina de emergência exige, por sua própria natureza, conhecimento científico apurado e especialização.
Qual a importância do CBMEDE diante desse contexto?
Camila Lunardi — O CBMEDE é um evento que reúne especialistas de todo o Brasil num só lugar. Esse é o ponto-chave. É comum que alguns emergencistas acabem isolados na sua cidade ou estado. Quando eles vêm para um Congresso como o CBMEDE, eles ouvem, veem e reconhecem que as suas dificuldades são comuns a todos. As ansiedades e conquistas são exatamente as mesmas de outros colegas. O CBMEDE é um momento de identificação entre iguais. Muitas vezes, o médico está isolado no serviço de emergência da sua região e não fica nítida a sua identidade enquanto médico emergencista. Esse inclusive é um dos motivos pelos quais alguns médicos não pleiteiam o Registro de Qualificação de Especialista (RQE). No CBMEDE, fica fácil perceber que há cerca de outras mil pessoas que pensam como ele, que agem e trabalham como ele. Aí sim, ele começa literalmente a se apropriar da especialidade e consolidar sua identidade.